terça-feira, 16 de setembro de 2008

Os outros



Os outros

Quando eu era criança, nunca tive desejo de ter um carro. Porque morava num lugar em que não passavam carros. Lá distante, onde era a Avenida Aparício Borges, onde só minha vista alcançava, eu via que passavam os carros, mas não fazia a menor idéia de quem eram seus donos.

Eu só fui ter desejo de ter um carro quando identifiquei os donos dos carros e vi que eles eram diferentes de mim por eu não ter carro. Foi a minha primeira comparação, o abismo que me levou a achar que os outros eram mais felizes do que eu.

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O que quero dizer é o seguinte: se olharmos só para o que somos, temos mais chances de sermos felizes.

O diabo é que não é isso que acontece: vivemos nos espelhando nos outros, a nossa aflição consiste em tentarmos ter o que os outros têm, quando não termos mais do que os outros, sermos melhores ou iguais aos outros.

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Em Cuba, por exemplo, onde todos são pobres, todos ganham pouco, ninguém se julga infeliz.

Os cubanos infelizes são aqueles que sabem que a poucos quilômetros da ilha existe Miami, os EUA, onde as condições de vida dos norte-americanos são infinitamente melhores que as dos cubanos. Isso passa a ser insuportável, pois se instala neles a idéia de que suas vidas são muito piores que as dos seus vizinhos norte-americanos.

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Em outras palavras, só pode ser feliz quem não acha os outros mais felizes.

Toda a encrenca humana reside em nos compararmos com nossos vizinhos, isto é, com os outros.

Sempre que acharmos que alguém é mais feliz do que nós, acabaremos sendo infelizes.

É muito difícil para os humanos encarar com naturalidade a felicidade dos outros, até mesmo porque aos nossos olhos invejosos os outros são mais felizes do que realmente o são.

O próprio Sartre disse que “o inferno são os outros”.

O que quer dizer que nós teríamos muito mais chances de sermos felizes e realizados se olhássemos só para nós.

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Por isso é que os livros sagrados dizem que ser rico não é possuir todas as riquezas, no nosso caso muito dinheiro, muitas propriedades, viajar para onde nos apetecer.

Ser rico, dizem os livros sagrados, é contentar-se com o que se tem.

Se há um segredo de felicidade é este: achar que é bastante o que se possui, sem olhar para o que possuem os outros.

Sei que estou dando uma receita quase impossível de seguir, mas também sei que é a única receita capaz de levar uma pessoa a ser feliz.

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Pelo amor de Deus, isso não quer dizer que o homem não deva ambicionar, até mesmo porque a razão central do progresso dos homens e das nações é a ambição.

Mas a ambição deve ser uma meta, uma trilha a seguir, e não o despeito por ver que os outros têm mais do que nós.

Ou seja, a felicidade está apenas no que somos e no que desejamos ser, mas sem nos importarmos com o parâmetro alheio.

Assim, justo é que queiramos crescer porque vemos que há espaço para crescermos – e não porque entendemos que os outros estão mais crescidos.

Fôssemos ser infelizes porque possuímos menos do que os outros, teríamos que paralisar, cruzar os braços e nunca mais avançar quando constatássemos que outros possuem muito menos do que nós.

*Texto publicado na página XX de Zero Hora dominical

Paulo Santana



Queria eu ser pago para proferir meus pensamentos em páginas de jornais, comentar sobre vários assuntos, postei esse aí pra diferenciar um pouco né! Estou meio "humanístico" ultimamente. Paulo Santana é um pensador, dos poucos que respeito na televisão, a arte e os pensamentos em geral já não tem mais espaço a tempos, me vejo agarrado pelo capitalismo, terei de morrer trabalhando, repito "QUERIA EU GANHAR DINHEIRO ASSIM" hahahaha


segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Será Que Eu Vou Virar Bolor?

Arnaldo Baptista

Composição: Arnaldo Baptista

Hoje eu percebi
Que venho me apegando às coisas
Materiais que me dão prazer
O que é isso, meu amor?
Será que eu vou morrer de dor
O que é isso, meu amor?
Será que eu vou virar bolor?
Venho me apegando ao passado
E em ter você ao meu lado
Não gosto do Alice Cooper
Onde é que está meu rock'n'roll?
Eu acho, eu vou voltar pra Cantareira
Venho me apagando aos meus sonhos
E à minha velha motocicleta
Não gosto do pessoal da Nasa
Cadê meu disco voador?
Onde é que está meu rock?
Onde é que está meu rock'n'roll?



Para não virar bolor, muito menos morrer de dor, é preciso disseminar arte!


Eu sou muito inútil, não tenho nada pra escrever! Por isso vou recomendar arte, verdadeira arte aquela a qual podemos tirar várias conclusões, que só nós podemos elevar nossos pensamentos através dela, que nos faz pensar, etc. Não quero relatar o quanto ao alto atingi os meus pensamentos em "O Lobo da Estepe" quero deixar para vocês lerem e apreciarem esse romance, aliás, é fascinante, são mil coisas, acho também que não tem uma idade certa para lê-lo, simplismente algo recomendado, só não deixem de ler.Não vou deixar influência, elevem os seus pensamentos ao lerem a incrível história de Harry Haller, de minhas conclusões elas estão guardadas, até de utilidade teriam, mas assim seria demasiado vaidoso, adoro ver os outros, ler os outros, cada qual em sua percepção do mundo e de tudo, e me fascina, as pessoas me fascinam! Depois de lerem o livro eu falo mais sobre tal, acontece que já ta ficando calor, e o inverno me deixa com bons pensamentos, verão tem cara de preguiça...


"Em O Lobo da Estepe, considerado o melhor dos livros de Hermann Hesse e sem dúvida um dos romances mais representativos do século XX, temos a história de Harry Haller, um outsider, um misantropo de cinqüenta anos, alcoólatra e intelectualizado, angustiado e que não vê saída para sua tormentosa condição, autodenominando-se “lobo da estepe”. Mas alguns incidentes inesperados e fantásticos o conduzem lenta porém decisivamente ao despertar de seu longo sono: conhece Hermínia, Maria e o músico Pablo. E então a história se desenvolve, guiando-nos num êxtase febril ao seu surpreendente desenlace final."


"Era uma vez um certo Harry, chamado o Lobo da Estepe. Andava sobre duas pernas, usava roupas e era um homem, mas não obstante era também um lobo das estepes. Havia aprendido uma boa parte de tudo quanto as pessoas de bom entendimento podem aprender, e era bastante ponderado. O que não havia aprendido, entretanto, era o seguinte: estar contente consigo e com sua própria vida. Era incapaz disso, daí ser um homem descontente. Isso provinha, decerto, do fato de que, no fundo de seu coração, sabia sempre (ou julgava saber) que não era realmente um homem e sim um lobo das estepes. As pessoas argutas poderão discutir a propósito de ser ele realmente um lobo, de ter sido transformado, talvez antes de seu nascimento, de lobo em ser humano, ou de ter nascido homem, porém dotado de alma de lobo ou por ela dominado; ou, finalmente, indagar se essa crença de que ele era um lobo não passava de um produto de sua imaginação ou de um estado patológico. É inadmissível, por exemplo, que, em sua infância, fosse rebelde, desobediente e anárquico, o que teria levado seus educadores a tentar combater a fera que havia nele, dando ensejo assim a que se formasse em sua imaginação a idéia e a crença de que era, realmente, um animal selvagem, coberto apenas com um tênue verniz de civilização. A esse propósito poder-se-iam tecer longas considerações e até mesmo escrever livros; mas isso de nada valeria ao Lobo da Estepe, pois para ele era indiferente saber se o lobo se havia introduzido nele por encantamento, à força de pancada ou se era apenas uma fantasia de seu espírito. O que os outros pudessem pensar a este respeito ou até mesmo o que ele próprio pudesse pensar, em nada o afetaria, nem conseguiria afetar o lobo que morava em seu interior."


HERMANN HESSE