sábado, 2 de agosto de 2008

CULTURA

Caros amigos, esta semana que passou estive lendo no jornal Le Monde Diplomatique sobre cultura e democracia. O “artigo” faz parte de um encarte chamado Cadernos da América Latina (V), onde filósofos, escritores, sociólogos, antropólogos e estudiosos latino-americanos escrevem sobre temas diversos. O Texto da filósofa brasileira Marilena Chauí chamou-me a atenção; sendo de boa qualidade e esclarecedor, gostaria, então, de compartilhar um pouco do conhecimento com vocês.
O texto tem seus primeiros parágrafos focados em apresentar os conceitos que as criaturas definiram para a cultura, que, diga-se de passagem, se alteraram junto com a história da humanidade e seguindo suas tendências, um exemplo disso, citado pela autora, é o período do Iluminismo (séc 18) em que “a palavra cultura ressurge como sinônimo de civilização.(...) Os iluministas estabeleceram o padrão Europeu capitalista para medir a evolução ou o grau de progresso de uma cultura. As sociedades passaram a ser avaliadas segundo a presença ou a ausência de alguns elementos que são próprios do ocidente capitalista e a ausência desses elementos foi considerado sinal de falta de cultura, todos as sociedades diferentes do padrão europeu são definidas como culturas “primitivas”. Foi justamente esse pensamento que legitimou a colonização e o imperialismo.” Infelizmente, até hoje temos vestígios dessa “forma de julgamento” de tudo que é diferente, do que dita o que é bom ou ruim, ainda aceitamos os padrões europeus e norte-americanos como única forma de cultura propriamente dita, a qual deve-se seguir como padrão, e acabamos contraditoriamente apoiando a marginalização da nossa própria cultura.
Ao longo do texto, também aparece a questão da divisão originária, compreendida pela primeira vez por Maquiavel quando, em O príncipe, afirma: “toda cidade é dividida pelo desejo dos grandes de oprimir e comandar e o desejo do povo de não ser oprimido nem comandado” e reafirmado por Marx “até agora, a história tem sido a história da luta de classes”. A marca da sociedade é a existência da divisão social, isto é, da divisão de classes. Não sendo diferente com a cultura, essa divisão foi transferida como cultura dominante e cultura dominada, opressora e oprimida, de elite ou popular. Assim, convencinou-se chamar de cultura formal, ou seja, a cultura letrada, e a cultura popular, que corre espontaneamente nos veios da sociedade.
Sabemos que o lugar da cultura dominante é bastante claro: é o lugar a partir do qual se legitima o exercício da exploração econômica, da dominação política e da exclusão social. Mas esse lugar também torna mais nítida a cultura popular como aquilo que é elaborado pelas classes populares e, em particular, pela classe trabalhadora, segundo o que se faz no pólo da dominação, ou seja, como repetição ou como contestação, dependendo das condições históricas e das formas de organização populares.
Outro ponto muito relevante a que se refere a autora é o papel da indústria cultural ou cultura de massas. Essa, em primeiro lugar, separa os bens culturais pelo seu suposto valor de mercado: há obras “caras” e “raras”, destinadas aos privilegiados que podem pagar por elas, formando uma elite cultural; e há obras “baratas e “comuns”, destinadas à massa, Assim, em vez de garantir o mesmo direito de todos à totalidade da produção cultural, a industria cultural sobre-determina a divisão social acrescentando-lhe a divisão entre elite “culta” e massa “inculta”. Em segundo, contraditoriamente com o primeiro aspecto, cria a ilusão de que todos têm acesso aos mesmos bens culturais, cada um escolhendo livremente o que deseja. No entanto, basta darmos atenção aos horários dos programas de rádio e televisão ou ao que é vendido nas bancas de jornais e revistas para vermos que as empresas de divulgação cultural já selecionaram de antemão o que cada classe e grupo social pode e deve ouvir, ver ou ler. No caso dos jornais e revistas, por exemplo, a qualidade do papel, letras e imagens, o tipo de manchete e de matéria publicada definem o consumidor e determina o conteúdo daquilo a que cada um terá acesso e o tipo de informação que poderá receber. Se compararmos, numa manhã, cinco ou seis jornais, perceberemos que o mesmo mundo – este no qual todos vivem – transforma-se em cinco ou seis mundos diferentes ou mesmo opostos, pois um mesmo acontecimento recebe cinco ou seis tratamentos diversos, em função do leitor que a empresa jornalística tem interesse (econômico e político) de atingir.
Em terceiro lugar, a industria culutral inventa uma figura chamada “espectador médio”, “ouvinte médio” e “leitor médio”, aos quais são atribuídas certas capacidades mentais “médias”, certos conhecimentos “médios” e certos gostos “médios”. Que significa isso? A indústria cultural vende cultura. Para vendê-la, deve seduzir e agradar o consumidor. Para seduzi-lo e agradá-lo não pode chocá-lo, provoca-lo, fazê-lo pensar, trazer-lhe informações novas que o perturbem, mas deve devolver-lhe, com nova aparência, o que ele já sabe, já viu, já fez. A “média” é o senso-comum cristalizado, que a indústria cultural devolve com cara de coisa nova. (...)
Nossa autora, ainda aborda muitos assuntos relacionados a esse tema, mas por enquanto vamos pensar nesses. Tu já te destes conta do tipo de informação que tu consomes? Já pensastes porque certas expressões são usadas? Já pensaste em como um assunto foi desviado, ocultado ou teve maior ou menor importância do que deveria? E o que te oferecem como cultura, o que tu ouves, lês e até criticas, o que tu ignoras...
Bem brotos, espero que pelo menos se não concordam com o dito defendam suas opiniões, se curtiram o texto e o assunto diferenciado dêem um sinal e terão mais!
Grande upa da Jana que vos fala.

10 comentários:

Anônimo disse...

Excelente texto. É preciso combater a concepção elitista de cultura e promover a criação, a socialização e a difusão dos bens culturais. Textos como este nos auxiliam a compreender os processos que levam as diversas formas de exclusão social. Parabéns a autora! Abraço!
Alisson Ferronato dos Santos
Tesoureiro da Sociedade Botucaraí Pró-Cultura

Touanda disse...

ó, é verdade. Depois eu queria ler na íntegra o texto original...
sobre a definição de cultura é uma daquelas coisas que cada um responde de um jeito e entende de um jeito. Quando nos horrorizamos com a ignorância de alguém, devemos pensar e questionar o que, afinal, faz aquela pessoa pensar de tal forma, se é loucura ou sensacionalismo captado de algum meio de mídia 'cultural' ao qual ela é 'submetida'. Aquela historinha de que o povo gosta é de escândalo, apesar de ser uma generalização, pode servir como um exemplo: o que o brasileiro recebe por grandes comunicadores é cultura ou tortura mental? Isso se confunde quando o sentido de cultura passa a ser o conjunto de qualquer coisa popular cravada na cabeça do povo, utilizado pra caracterizar, de qualquer forma, tal sociedade. Muitos têm opiniões formadas e indiscutíveis sobre o que não conhecem, como se um PEDAÇO de CULTURA bastasse para desmerecer uma nação inteira.

Enfim, seja lá como for chamada, cultura serve, às vezes, para demoninar maravilhas. As autora dos textos tem bastante dela. :)
Touanda

Anônimo disse...

Muito bom texto, Jana.
Entre outras coisas, isso me lembra um comentário que eu ouvi esses dias e q pode servir de exemplo em um pouco do q vc disse "Só falam nessa Isabella porque ela era de família rica. Vai lá ver quantas meninas pobres não sofrem tanto ou mais, e como não tem dinheiro, são esquecidos pela mídia?"
A sociedade é deprimente. Fato.
=***
Eti

Allan disse...

Muito bom. Eu defende o ceticismo sobre "cultura" de televisão jornais, etc. Porque o que vêm desses meios já está mastigado e vomitado para nós lermos/ouvirmos...
Sobre um assunto desviado e tal, isso é fruto da chamada "democracia" em que vivemos, ora qual democracia? Se o poder ainda está nas mãos de poucos! Tanto quanto o poder de difundir informação também está na mão de poucos.


O valor de percepção sobre a cultura nos leva a buscar a verdadeira cultura. Tudo que soa verdadeiro, tudo que tem "ar de verdade" pra mim é cultura, como esse texto e todo o Blog. Muito legal, MESMO.

Allan disse...

No entanto, basta darmos atenção aos horários dos programas de rádio e televisão ou ao que é vendido nas bancas de jornais e revistas para vermos que as empresas de divulgação cultural já selecionaram de antemão o que cada classe e grupo social pode e deve ouvir, ver ou ler. No caso dos jornais e revistas, por exemplo, a qualidade do papel, letras e imagens, o tipo de manchete e de matéria publicada definem o consumidor e determina o conteúdo daquilo a que cada um terá acesso e o tipo de informação que poderá receber. Se compararmos, numa manhã, cinco ou seis jornais, perceberemos que o mesmo mundo – este no qual todos vivem – transforma-se em cinco ou seis mundos diferentes ou mesmo opostos, pois um mesmo acontecimento recebe cinco ou seis tratamentos diversos, em função do leitor que a empresa jornalística tem interesse (econômico e político) de atingir.


UM grande modelo de percepção!

Unknown disse...

Grande Jana, boa leitura, interpretar a Chauí não é fácil, beleza e meus parabéns.
Grande beijo e continue que é o caminho.

Anônimo disse...

adorei o texto jana muito bom mesmo
gostei do comentário que o allan fez
"Porque o que vêm desses meios já está mastigado e vomitado para nós lermos/ouvirmos..."
e isso é verdade :)

Thainá disse...

gostei do texto Jana.
muito bom
parabéns :)

Allan disse...

Sim mariah é verdade. Mas esse "artigo" que foi muito bem interpretado pela Jana nos faz pensar, e isso já coloca-o como melhor. Não um simples "tratado de idéias" mas algo de valor maior, está em um jornal, mas não no Brasil!

Anônimo disse...

Realmente, adorei o texto, Jana! Continue nos presenteando com essas interpretações, pois é muito melhor receber algo "mastigado e vomitado" de alguém que saiba o que tá falando sem intenção de nos manipular. Parabéns!